domingo, 4 de setembro de 2016

1 - Uma Rosa para Deus - Minha Confissão


1 – Uma Rosa para Deus

Nasci pelas mãos de Rosa, de Castelo, e renasci pelas mãos de Rosa, de Viterbo. De fato, minha avó, Rosa Sellitti Rangel, fez meu parto. Nasci em sua casa, em Castelo, Estado do Espírito Santo. E a outra Rosa, de Viterbo, Itália,  me trouxe de volta à Igreja, depois de uma longa e triste ausência.

Pois este meu filho estava morto e voltou à vida; estava perdido e foi achado. (Lucas 15:24)





Foi ouvindo os sons do sino de uma capelinha que via da minha varanda que, um dia, mordido de curiosidade fui até lá para conhecê-la, sem maiores pretensões. Fiquei na soleira da porta, chorando, sem conseguir entrar, enquanto a Missa transcorria.

Aos poucos fui conhecendo Santa Rosa de Viterbo, e passei a amá-la. Quis voltar ao rebanho. Ainda vivo aos trancos e barrancos, em altos e baixos, mas, Santa Rosinha - como gosto de chamá-la - tem me ajudado a percorrer o Caminho, no qual espero estar até o fim desta vida, e, se a Graça de Deus me socorrer, encontrar as duas rosas de minha vida no Céu.

Sonhei em visitar Viterbo à medida que crescia o meu amor e interesse pela história da santinha, que tão jovem entregou-se totalmente a Deus, de forma heroica. Queria tudo saber sobre ela. Este sonho se tornou realidade, depois de quase duas décadas do nosso  primeiro encontro. De fato, nos dias 6 e 7 de abril de 2016, eu a vi no seu Santuário. E, com grande emoção participei da Missa e do Ofício Divino com as freiras que zelam por sua memória.

Que o Espírito Santo seja o meu guia na realização deste trabalho, que é singelo, sem grandes pretensões. É, antes de tudo, um agradecimento por todas as benesses recebidas por sua poderosa intercessão, do qual dou testemunho e poderão constatar no decorrer da leitura.

Não se fará uma narrativa linear. Cada capítulo poderá ser lido de forma independente, sem perda substancial. Far-se-á remissão a esta ou aquela passagem no decorrer do livro, se for o caso. Não se trata esta obra de um romance histórico, isto é, baseado nos dados históricos que dispomos romancear a vida de Rosa. Apenas procurou-se lançar alguma luz sobre alguns aspectos da sua biografia, sendo o mais fiel possível a tais dados. Por isto são transcritos na íntegra os relatórios dos processos de canonização para apreciação e interpretação de cada leitor, ao seu livre arbítrio.

Por outro lado, não queremos afirmar que a narrativa está isenta de emoções. Este é um livro de um apaixonado, e não se procurou mascarar esta paixão em prol de uma pretensa obra científica. A palavra da ciência, contudo, está presente em toda a obra. É nossa visão, entretanto, que - apesar de todo o racionalismo dos tempos modernos, e da vã tentativa da ciência de produzir um discurso definitivo, imparcial, absoluto -, ciência e fé são inseparáveis[1]; são como duas faces da mesma moeda. Quem só usa a razão é um ser sem razão!

Se alguma pretensão tem este trabalho é a de que ele seja edificador para os que vierem a lê-lo, que desperte e fortaleça a fé de cada um de nós, sobretudo dos jovens, dos quais Rosa é Padroeira. E, alimentados na fé, que usemos a razão na realização das boas obras.


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[1] Sobre esta questão indicamos a leitura da Carta Encíclica Fides et Ratio, do Papa São João Paulo II.

Índice - Sumário


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Sumário






3.1 – Vita Prima

3.2 – Vita Seconda


4.1 – A Palavra da Ciência













12 – Bibliografia



O Corpo Incorrupto de Santa Rosa de Viterbo sendo transportado pelos Facchini (2016)



2 - Sic in Sanctis suis mirabilis...


2 - Sic, in Sanctis suis mirabilis…

Tão maravilhoso nos seus santos e bendito para sempre o nosso Deus”. Estas foram as palavras, numa tradução singela, com que o Papa Inocêncio IV iniciou a Bula Sic in Sanctis, do primeiro processo de canonização de Rosa (Vita Prima).

Houve outro processo (Vita Seconda), mas nenhum deles chegou a termo. O nome de Rosa, contudo, numa excepcionalidade na História da Igreja, foi inscrito no Martirológio Romano, e elevado ao culto nos altares – com Missa Própria e Ofício - e tem dois dias oficiais de celebração em sua memória.

O que tem de especial esta menina, que foi declarada Padroeira da Juventude Franciscana, falecida no dia 6 de Março de 1251, aos 17 anos de idade, para ter tal deferência? E, porque, além do dia 6 de Março – dia do seu trânsito (quando a Igreja celebra a memória de cada santo), também é comemorada no dia 4 de Setembro? Na véspera deste dia, aliás, em Viterbo, ocorre uma extasiante festa com o Transporte da Macchina di Santa Rosa: da Porta Romana até o Santuário. São estruturas belíssimas, cujos modelos mudam de tempos em tempos, e chegam a atingir 30 metros de altura e pesar várias toneladas. São transportadas nos ombros dos Facchini di Santa Rosa. É tão impressionante esta festa que foi declarada pela UNESCO Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade.

Mas, o principal: quem foi esta menininha, tão amada por Deus, a ponto de receber visitas da Virgem Maria?

RECONSTRUÇÃO FACIAL DE SANTA ROSA DE VITERBO


Rosa teve uma breve passagem neste mundo, mas deixou uma marca indelével, ao ponto de despertar a admiração dos papas: desde o seu tempo até os dias de hoje. Com efeito, ela foi portadora da Voz de Deus e da Igreja, num tempo em que esta sofria grandes perseguições - como, de resto, ainda sofre, em pleno Século XXI. A ela são atribuídos, nos autos dos processos, numerosíssimos e impressionantes milagres ocorridos por sua intercessão: da ressurreição de mortos à passagem por uma “Prova do Fogo”. De fato, narra-se que ela entrou numa fogueira para converter uma herética, em Vitorchiano, e ali permaneceu por longo tempo saindo ilesa.

O CORPO INCORRUPTO DE SANTA ROSA EM PROCISSÃO (2016)



Os milagres atribuídos à sua intercessão junto a Deus por nós continuam a ser catalogados. É impressionante o livro Il Libro dei Miracoli di Santa Rosa da Viterbo, do Postulador da Causa dos Santos Frei Ernesto Piacentini, O.F.M. Conv., publicado em 1991. Desafiando a ciência e os espíritos mais racionais, seu corpo permanece incorrupto depois de mais de sete séculos, e pode ser visto em seu Santuário.


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2.1 - O Caminho da Santidade


2.1 - O Caminho da Santidade

Rosa nasceu em uma humilde família. Seus pais se chamavam Giovanni e Caterina, revela a Vita Prima. Desde criança manifestava seus dons espirituais. Em contato com a família franciscana, desejou, depois de uma visão da Virgem Maria, entrar para o Monastério das Clarissas de São Damião, mas foi-lhe recusado a realização deste desejo. Profetizou, então, que depois de sua morte ali seria recebida.

A recusa, contudo, não impediu Rosa de viver o carisma do Seráfico Pai São Francisco. Fez de seu quarto a sua cela, até que a própria Virgem Maria lhe aparecesse e lhe desse uma missão: evangelizar e trazer de volta à Igreja os viterbenses que, fruto dos conflitos da Igreja com o Imperador Frederico II, tomaram o partido deste. Era o tempo da luta entre os Guelfos e os Gibelinos.

Instada pela Virgem Maria, Rosa vestiu o Hábito da Penitência como os irmãos da Ordem Terceira de São Francisco, e com um Crucifixo nas mãos – que lhe aparecera milagrosamente, segundo os relatos – saiu pelas ruas e praças da cidade a evangelizar. O fato causou muita comoção em Viterbo, e muitos voltaram para a Fé Católica. Os partidários do Imperador, que dominavam a cidade, viram em Rosa uma ameaça real e ela foi exilada com seus pais. Foram para Soriano del Cimino e Vitorchiano, e continuou sua pregação. De lá previu a morte do Imperador Frederico II, o que de fato ocorreu uma semana depois, e ela voltou para Viterbo, vivendo seus últimos dias como uma monja, em seu pequeno quarto.

Já em vida era tida como uma santa. Ao falecer, o Bispo, clero e o povo de Viterbo solicitaram ao Papa Inocêncio IV sua canonização, e este, em 25 de Novembro de 1252 mandou instalar o processo. Ordenou, então, fosse exumado o corpo, que havia sido enterrado, em terra nua, no cemitério de sua paróquia de Santa Maria in Poggio, e que fosse transferido ao interior da igreja. Qual a surpresa de todos ao constatarem que o mesmo estava perfeito, como se ela acabasse de falecer.

Inocêncio IV faleceu antes de ser concluso o Processo de Canonização, que depois foi abandonado. Um segundo foi instaurado em 1 de abril de 1457, pelo Papa Calisto III. Foi fechado, também, em 4 de julho de 1457, sem conclusão. Sucedendo Inocêncio IV, subiu ao Trono de São Pedro Alexandre IV[1]. Este, segundo relatos, teria sonhado várias vezes com Rosa, onde ela pedia que fosse enterrada no Monastério das Clarissas, que a havia recusado em vida, como sabemos. Tão insistentes os sonhos que Alexandre IV mandou exumar novamente o corpo, e este, para maior espanto, ainda, continuava perfeitíssimo.

Em virtude deste milagre, o próprio Papa, em 4 de Setembro de 1258, levou-a em procissão, acompanhado da corte papal, todo o clero e povo de Viterbo, para aquele monastério, realizando, assim, a profecia de Rosa de que ali seria recebida depois de morta. E o monastério passou a ser chamado, então:




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[1] Curiosa a história destes papas e a relação deles com Santa Rosa e a Ordem das Clarissas. O primeiro, Inocêncio IV, foi quem aprovou, através da Bula Solete Annuere a Regra de Vida de Santa Clara, solicitada pelo segundo, quando era apenas Cardeal Reinaldo de Segni. A bula foi assinada por Inocêncio IV 12 dias após ter mandado exumar o corpo de Rosa. Santa Clara recebeu a Bula no leito de morte e passa para a vida eterna no dia seguinte, em 11 de Agosto de 1253.

2.2 - A Bula "Sic in Sanctis" do Papa Inocêncio IV


2.2 - A Bula do Papa Inocêncio IV

A Bula[1] Papal Sic in Sanctis de Inocêncio IV, de 25 de novembro de 1252, é o primeiro documento oficial da Igreja e, também, o mais antigo concernente a Rosa de Viterbo. O fato de ter sido exarada pouco tempo após sua morte – um ano e oito meses - revela-nos muito sobre o conceito que ela tinha entre os seus contemporâneos. A aura de santidade que a envolvia fica patente, a admiração dos seus concidadãos, bem como a notícia dos milagres alcançados por sua intercessão.

Depreende-se que tal bula é uma resposta ao clero, autoridades e povo de Viterbo, que haviam solicitado a abertura de um processo de canonização. De tal missiva endereçada ao Papa não há notícia, até o momento, de que tenha sido preservada, em algum local. Nenhum biógrafo, antigo ou contemporâneo, manifesta ter conhecimento desta missiva. Ela tornou-se muito importante para os estudiosos recentes que, mais cuidadosos sob o ponto de vista cronológico, por exemplo, puderam corrigir vários erros cometidos por biógrafos antigos, permitindo, via de consequência, fixar com fidedignidade alguns acontecimentos da vida de Rosa, como o próprio ano de seu nascimento, e da morte, que foram motivo de disparidades grosseiras nas antigas biografias.

Seu conteúdo provoca uma série de ilações. Infere-se, por exemplo, que o Pontífice ficou bastante sensibilizado com a solicitação que lhe foi dirigida e mostrou-se muito simpático à causa. Confirmar-se-ia, então, uma tradição de que este a canonizaria brevemente se não falecesse pouco tempo após a abertura do processo.
Neste primeiro testemunho oficial da Igreja sobre a santidade de Rosa já podemos constatar que os milagres atribuídos à sua intercessão eram flagrantes: clara miraculorum indicia, diz a Bula, ou seja, “evidência clara de milagres”.

O Papa é assertivo, também, quando fala das virtudes e heroísmo de Rosa: manteve intacta a flor de sua virgindade, elevada pureza de coração, e uma vida impecável à altura da perfeição e muito heroísmo. (grifo nosso).

É possível que o Papa Inocêncio IV houvesse tido informações sobre as virtudes e ações de Rosa enquanto esta ainda vivia, pois a Bula deixa certa margem para esta interpretação. De fato, Viterbo era uma cidade muito importante para o Papado, e seria pouco provável que uma atividade como a de Rosa ficasse restrita ao conhecimento da população local e passasse totalmente despercebida pela hierarquia eclesiástica, até mesmo do Sumo Pontífice.

Rosa fora exilada de Viterbo por ter se tornado deveras inconveniente para os partidários de Frederico II e sua fama já ultrapassara as muralhas da cidade, como se constata por sua passagem em Vitorchiano e Soriano del Cimino[2]. Assim, quando o Papa a descreve como “cheia de coragem a tão invencível Rosa, sua serva, de venerada memória”, é provável que estivesse se referindo aos seus próprios conhecimentos sobre ela. Recomenda, contudo, toda cautela aos destinatários da Bula, como é protocolar em um processo de canonização.
Diz o documento[3]:


Inocêncio Bispo, Servo dos Servos de Deus
Diletos filhos etc.

Nosso Deus, que é maravilhoso em seus santos, e abençoado eternamente, tem, no deserto desta vida mortal, adornado com tantas virtudes e cheia de coragem a tão invencível Rosa, sua serva, de venerada memória, que em meio aos perigos do mundo manteve intacta a flor de sua virgindade, elevada pureza de coração, e uma vida impecável à altura da perfeição e muito heroísmo, como uma propagação odorífica de uma rosa ao seu redor com a fragrância de seus exemplos sublimes. Finalmente, de acordo com, pelo menos, a crença piedosa dos fiéis, ela merece sentar-se no trono da glória eterna, e fazer parte dos coros celestiais de virgens; como demonstrado, temos a certeza, as evidências claras de milagres que a bondade de Deus opera na terra através de sua intercessão.
Além disso, uma lâmpada não deve ser escondida debaixo do alqueire, mas brilhar aos olhos dos crentes e não crentes, para o fortalecimento da fé, o nosso muito querido filho, o bispo eleito, o clero, o conselho e as pessoas de Viterbo, animados, com razão, justamente por estes milagres, pediu-me humilde e respeitosamente para abrir um procedimento informativo relativo às fragrâncias de santidade desta nova rosa para dizer sobre os méritos de sua vida e milagres a ela atribuídos; de modo a que goze da bem-aventurança e recompensa na Igreja Triunfante, e receber, simultaneamente, dentro da Igreja Militante, as honras que são devidas a esta virgem gloriosa que brilhou tão grandemente diante dos homens e para que seja reconhecida e louvada como um dos protetores dos homens diante de Deus.
Queremos acolher este desejo com bondade; mas, numa decisão de tal importância, é preciso proceder com maturidade, de modo que os hereges, que difamam os bons e tentam encontrar manchas até nos eleitos, não encontrem qualquer pretexto para insultar os fiéis; por nossa carta apostólica, nós prescrevemos o seguinte à vossa prudência bem conhecida.
Vós deveis cuidar que compareçam perante vós legalmente e interrogar sobre a vida e os milagres de Rosa, sem omitir qualquer circunstância, todas as testemunhas, credíveis e com as qualificações exigidas por lei, o que for possível conhecer e produzir; vós procedereis, neste exame, a fórmula de interrogatório que nós vos transmitimos; vós redigireis fielmente por escrito e oporás vosso selo; vós os depositareis, em seguida, em diversos locais seguros e os conservareis, até que, a pedido do bispo eleito, do clero, do conselho e das pessoas de Viterbo, ou nosso próprio ordenamento, nós os reivindicarmos para julgar a causa sobre esta matéria. Não obstante etc.
Dado em Perugia, 25 de novembro. Ano décimo de nosso pontificado



Texto Latino:



INNOCENTIUS EPISCOPUS, Servus Servorum Dei.
Dilectis filiis Priori Fratrum Praedicatorum et archipresbytero S. Sixti Viterbien, salutem et apostolicam benedictionem

Sic, in sanctis suis mirabilis et benedictus in saecula, Deus noster Venerande Memoriae Rosam virtute ac fortitudine, in huiusmodi vitae solitudine, dicitur solidasse ut, inter mundanos incursus et vitiorum illecebras, virginei floris integritate servata, per virtutum ardua immaculato calle pertransiens, ac nitorem in conscientia praeferens, foris aliis, velut rosa, redoluerit per exemplum ac tandem, secundum pietatis fidem, thronum gloriae conscendere meruerit choris virgineis sociata, prout clara miraculorum indicia quae in terris divina bonitas operari dicitur, protestantur.
Ne lucerna sub modio lateat sed ad veritatis agnitionem infidelibus et fidelibus ad fidei fulcimentum, his sane miraculorum signis ac prodigiis dilecti Filii electus, cleros, consilium et populus Viterbien. Mérito, quin potius meritorie excitati, nobis humiliter et humaniter supplicarunt ut fidelium testimonia super ipsius novellae Rosae fragantia, videlicet vitae meritis, miraculorum assertionibus, recipi faceremus; ita quod quae felicitatis potiri creditur praemis in Ecclesia Triumpahnti, in militante quoque honore côngruo celebris habeatur et quase gloriosa Dei virgo coram hominibus claruit, pia innotescat patrona pro hominibus coram Deo.
Nos igitur ipsorum laudabile votum favore benévolo cupientes prosequi, cum in re tam profundi judicii tanta expediat maturitatis cautela procedi ut iis qui, perversitatis haeriticae fermento corrupti, loqui audent mala de bonis et in electis fingere maculam, ut ecclesiae sponsae Christi species decoloretur in membris, nullus insultandi fidelibus aditus relinquatur, discretioni vestrae, de qua plenam in Domino fiduciam obtinemus, per apostólica scripta mandamus quatenus super illius Rosa evita et miraculis testes, fide dignos atque legitimos, quos undecumque produci contigerit coram vobis, legitime recipere ac de singulis circumstantiis, juxta interrogatorii formam quam vobis sub Bulla nostra transmittimus, prudenter examinare curetis et ipsorum dicta, fideliter in scriptis redacta et sub propriis inclusa sigillis, in diversis locis caute servanda deponere studeatis, donec, praedictis electo, clero, consilio et populo nobis supplicantibus, vel motu nostro ca viderimus requirenda, ut tunc, eis inspectis secundum Deum, prout motum nostrum res clarius nota formaverit, in negotio procedamus. Non obstante indulgentia, qua tibi, Fili Prior, specialiter vel Ordini tuo generaliter a sede apostólica etc.
Datum Perusii, VII kalendas decembris, Pontificatus nostri anno decimo.



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[1] Uma bula é um documento pontifício relativo a temas de fé ou de interesse geral, concessão de graças ou privilégios, assuntos judiciais ou administrativos, expedido pela Chancelaria Apostólica, estampado com tinta vermelha. O termo "bulla" vem do latim e é empregado referindo-se à forma externa de um documento, que antigamente era lacrado com uma pequena "bola" (cápsula metálica redonda). O lacre era utilizado para proteger o selo de cera unido por um cordão a um documento de especial importância, com a finalidade de certificar sua autenticidade e autoridade. Com o passar dos anos, "bulla" indicou também o selo; depois, todo o documento selado - o que explica porque ainda hoje se usa o termo para todos os documentos papais de especial importância, que possuem, ou pelo menos tradicionalmente deveriam conter, o selo do Pontífice. O documento fica conhecido, ou recebe a alcunha, pelas palavras iniciais que contém: no presente caso as palavras “Sic in Sanctis”.
[2] Confira “Vita Seconda”.
[3] Tradução nossa da transcrição em Leon De KERVAL (1896), pg 199 e seguintes.

2.3 - São Francisco e Santa Rosa de Viterbo


2.3 – São Francisco e Santa Rosa

Rosa, que é a Padroeira da Juventude Franciscana (JUFRA), apesar da pouca idade e da curta vida, entregou-se de corpo e alma na defesa da Fé Católica e do Papado, inserindo-se totalmente, sem medir esforços, ao espírito de seu tempo. Sendo seu grande modelo, neste combate espiritual, e, também, corporal, São Francisco de Assis. Não podemos compreender bem Santa Rosa sem ter em mente, sem uma visão da conjuntura política de seu tempo, principalmente na Itália, e sem ter em mente a vida e obra do Seráfico Pai, e seus seguidores, que já estavam estabelecidos em Viterbo no transcurso da vida de Rosa. É a partir do contato com estes que Rosa desenvolverá sua espiritualidade, e terá o desejo de incorporar-se à vida monástica das clarissas do Monastério de São Damião.

Sobre São Francisco e seus discípulos muito se escreveu, se escreve e se escreverá. Quem não ouviu falar deles? Estão aí até hoje, produzindo seus frutos de Paz e Bem. É fácil achá-los e conhecê-los. Dedicaremos algumas linhas a mais sobre: a situação política no tempo de Santa Rosa, a posição de Viterbo e Frederico II em sua guerra contra o Papado, portanto. E indicamos, efusivamente, aos que ainda pouco sabem sobre a vida do Pai Seráfico e sua obra, a fazê-lo o quanto antes, pois seu exemplo e caminho seguido é cada vez mais necessário no mundo contemporâneo. Houvessem mais “franciscos” e o planeta não estaria nesta situação lamentável em que se encontra.

Transcrevemos, somente, algumas palavras do próprio Francisco: as Admoestações, O Cântico do Irmão Sol, e a conhecidíssima Oração de São Francisco, para nos servirem como um resumo de sua espiritualidade.





Admoestações

1 – Do Corpo do Senhor
Disse o Senhor Jesus aos seus discípulos: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida. Ninguém chega ao Pai senão por mim. Se me reconhecêsseis conheceríeis também o Pai. Doravante o conheceis porque o vistes. Disse-lhe Filipe: Senhor, mostra-nos o Pai e isto nos basta. Jesus respondeu-lhe: Há tanto tempo estou convosco e não me conheceis? Filipe, quem me vê, vê também meu Pai” (Jo 14,6-9).
“O Pai habita numa luz inacessível” (1Tm 6,16), e: “Deus é um espírito” (Jo 4,26) e “ninguém jamais viu a Deus” (Jo 1,18). Se Deus é espírito, só em espírito pode ser visto; pois “o espírito é que dá a vida, a carne não aproveita para nada” (Jo 6,63).
Mas também o Filho, sendo igual ao Pai, não pode ser visto por alguém de modo diferente que o Pai e o Espírito Santo. Por isso são réprobos todos aqueles que viram o Senhor Jesus Cristo em sua humanidade sem enxergá-lo segundo o espírito e a divindade e sem crer que Ele é o verdadeiro Filho de Deus. De igual modo são hoje em dia réprobos todos aqueles que – embora vendo o sacramento do corpo de Cristo que, pelas palavras do Senhor, se torna santamente presente sobre o altar, sob as espécies de pão e vinho, nas mãos do sacerdote – não olham segundo o espírito e a divindade, nem creem que se trata verdadeiramente do corpo e o sangue de Nossos Senhor Jesus Cristo. Atesta-o pessoalmente o Altíssimo quando diz: “Este é o meu corpo e o sangue da nova Aliança” (cf Mc 14,22); e: “Quem comer a minha carne e beber o meu sangue terá a vida eterna” (cf Jo 6,55).
Por isso é o Espírito do Senhor, que habita nos seus fiéis, quem recebe o santíssimo corpo e sangue do Senhor (cf Jo 6,62). Todos aqueles que não participam desse espírit e no entanto ousam comungar, “comem e bebem a sua condenação” (1Cor 11,29).
Portanto, “ó filhos dos homens, até quando tereis duro o coração?” (Sl 4,3). Por que não reconheceis a verdade “nem credes no Filho de Deus” (Jo 9,35)? Eis que Ele se humilha todos os dias (Fl 2,8); tal como na hora em que, “descendo do seu trono real” (Sb 18,5) para o seio da Virgem, vem diariamente a nós sob a aparência humilde; todos os dias desce do seio do Pai sobre o altar, nas mãos do sacerdote. E como apareceu aos santos apóstolos em verdadeira carne, também a nós se nos mostra hoje no pão sagrado. E do mesmo modo que eles, enxergando sua carne, não viam senão sua carne, contemplando-o contudo com seus olhos espirituais creram nele como no seu Senhor e Deus (cf. Jo 20,28), assim também nós, vendo o pão e o vinho com os nossos olhos corporais, olhemos e creiamos firmemente que está presente o santíssimo corpo e sangue vivo e verdadeiro. E desse modo o Senhor está sempre com os seus fiéis, conforme Ele mesmo diz: “Eis que estou convosco até a consumação dos séculos” (Mt 28,20).

2 – Do vício da própria vontade
Disse o Senhor a Adão: “Podes comer do fruto de todas as árvores do jardim, mas não comas do fruto da árvore da ciência do bem e do mal” (Gn 2,16-17). Podia, pois, Adão comer de toda árvore do paraíso e, enquanto nada fazia contra a obediência, não pecava. Como, porém, da árvore da ciência do bem e do mal aquele que reclama sua vontade como propriedade sua e se vangloria dos bens que o Senhor diz e opera nele. Assim, atendendo às sugestões do demônio e transgredindo o mandamento, foi-lhe dado o pomo da ciência do mal. Por isso tem que suportar necessariamente o castigo.

3 – Da obediência perfeita
Diz o Senhor no Evangelho: “Quem não renuncia a todos os seus bens não pode ser meu discípulo” (Lc 14,33), e “Quem quiser salvar a sua alma, perde-la-á” (Mt 16,25). Abandona tudo quanto possui e perde sua vida aquele que a si mesmo abandona inteiramente à obediência nas mãos do prelado. E tudo o que faz e diz, sabendo que não contraria a vontade dele, e sendo bom o que faz, é obediência verdadeira. E se acaso o súdito vê algo melhor e mais útil à sua alma do que aquilo que o prelado lhe ordena, sacrifique a Deus o seu conhecimento, se aplique com firmeza a cumprir as ordens do prelado, pois nisto é que consiste a verdadeira obediência feita com amor, que agrada a Deus e reverte a bem do próximo.
Entretanto, se o prelado der ao súdito alguma ordem contrária à alma, este todavia não se separe dele, embora não lhe seja lícito obedecer-lhe. E  se por esse motivo tiver de suportar perseguições da parte de alguém, que então o ame ainda mais por amor de Deus. Pois aquele que prefere aturar perseguições a querer ficar separado de seus irmãos, permanece verdadeiramente na perfeita obediência, porque “dá a sua vida pelos seus irmãos” (Jo 15,13).
Há efetivamente muitos religiosos que, sob o pretexto de verem coisas preferíveis às que os prelados ordenam, “olham para trás” (Lc 9,62) e “voltam ao vômito de sua vontade própria” (Pr 26,11). Esses tais são homicidas e, por seus exemplos funestos, causam a perdição de muitas almas.

4 – Que ninguém considere como propriedade sua o cargo de prelado
“Não vim para ser servido mas para servir” (Mt 20,28), diz o Senhor: Os que estão constituídos sobre os outros não se vangloriem dessa superioridade mais do que se estivessem encarregados de lavar os pés aos irmãos. E se a privação do cargo de superior os perturba mais que a privação do encango de lavar os pés, amontoam para si tanto mais riquezas com perigo para sua alma.

5 – Que ninguém se ensoberbeça, mas antes se glorie na cruz do Senhor
Considera, ó homem, a que excelência te elevou o Senhor, criando-te e formando-te segundo o corpo à imagem do seu dileto Filho e, segundo o espírito, à sua própria semelhança. Entretanto, as criaturas todas que estão debaixo do céu, a seu modo, servem e conhecem e obedecem ao seu Criador melhor do que tu. Não foram tampouco os espíritos malignos que o crucificaram, mas tu em aliança com eles o crucificaste e o crucificas ainda, quando te deleitas em vícios e pecados.
De que, então, podes gloriar-te? Mesmo que fosses tão arguto e sábio a ponto de possuíres toda a ciência, saberes interpretar toda espécie de línguas e perscrutares engenhosamente as coisas celestiais, nunca deverias gabar-te de tudo isso, porquanto um só demônio conhece mais das coisas celestiais e ainda agora conhece mais as da terra que todos os homens juntos, a não ser que alguém tenha recebido do Senhor um conhecimento especial da mais alta sabedoria.  Do mesmo modo, se fosses mais belo e mais rico que todos, e até operasses maravilhas e afugentasses os demônios, tudo isso seria estranho a ti nem te pertenceria nem disto te poderias desvanecer. Mas numa só coisa podemos “gloriar-nos: de nossas fraquezas” (2Cor 12,5), e carregando dia a dia a santa cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo.

6 – Da imitação de Cristo
Consideremos todos, meus irmãos, o Bom Pastor que, para salvar suas ovelhas, sofreu a paixão da cruz. As ovelhas do Senhor seguiram-no na tribulação, na perseguição, no opróbrio, na fome, na sede, na enfermidade, na tentação e em todo o mais, e receberam por isso do Senhor a vida eterna. É pois uma grande vergonha para nós outros servos de Deus, terem os santos praticado tais obras, e nós querermos receber honra e glória somente por contar e pregar o que eles fizeram.

7 – Que à inteligência deve seguir a boa ação
 Diz o Apóstolo: “A letra mata, mas o espírito vivifica” (2Cor 3,6). São mortos pela letra os que tão-somente querem saber as palavras, a fim de parecer mais sábios que os outros e poder adquirir riquezas e dá-las aos parentes e amigos. São ainda mortos pela letra aqueles religiosos que não querem seguir o espírito das Sagradas Escrituras, mas só se esforçam por saber as palavras e interpretá-las aos outros. São, porém, vivificados pelo espírito das Sagradas Escrituras aqueles que tratam de penetrar mais a fundo em cada letra que conhecem, nem atribuem o seu saber ao próprio eu, mas pela palavra e pelo exemplo o restituem a Deus, seu supremo Senhor, ao qual todo bem pertence.

8 – Do pecado da inveja a evitar
Diz o Apóstolo: “Ninguém pode dizer: ‘Jesus é o Senhor’, senão no Espírito Santo” (1Cor 12,3), e: “Não há quem faça o bem, não há sequer um só” (Rm 3,12). Todo aquele, pois, que tem inveja do seu irmão por causa do bem que o Senhor por ele diz e faz, comete pecado de blasfêmia, porque tem inveja do próprio Altíssimo, que é quem diz e faz todo bem.

9 – Da caridade
Diz o Senhor: “Amai os vossos inimigos”, etc. (Mt 5,44). Ama verdadeiramente o seu inimigo aquele que não se contristar pela injúria dele recebida, mas por amor de Deus se afligir com o pecado que está na alma dele, e por meio de obras lhe manifesta sua caridade.

10 – Da disciplina do corpo
Há muitos que, pecando ou recebendo alguma injúria, costumam lançar a culpa sobre o inimigo ou sobre o próximo. Mas assim não é na realidade, porquanto cada um tem sob o seu domínio o inimigo, isto é, o próprio corpo, por meio do qual ele peca. Feliz, pois, o servo (Mt 24,46) que, de contínuo, trouxer tal inimigo sob seu jugo e dele prudentemente se acautelar. Porque, enquanto assim agir, nenhuma outro inimigo visível ou invisível lhe poderá fazer mal.

11 – Que ninguém se deixe seduzir pelo mau exemplo de outrem
Ao servo de Deus nada deve desagradar senão o pecado. Mas se uma pessoa pecasse de qualquer forma que seja, e o servo de Deus ficasse por isso perturbado e enraivecido – a não ser por caridade – “entesouraria riquezas” (Rm 2,5) de culpa para si. Vive realmente sem nada de próprio aquele servo de Deus que não se enraivece nem perturba por causa de ninguém. E bem-aventurado aquele que nada retém para si, mas “dá a César o que de César, e a Deus o que é de Deus” (Mt 22,21).

12 – De como se reconhece o Espírito do Senhor
Eis o meio de reconhecer se o servo de Deus tem o Espírito do Senhor. Se Deus por meio dele operar alguma boa obra, e ele não o atribuir a si, pois o seu próprio eu é sempre inimigo de todo bem, mas antes considerar como ele próprio é insignificante e se julgar menor que todos os outros homens.

13 – Da paciência
O servo de Deus não pode conhecer em que medida possui a paciência e a humildade, enquanto se sentir satisfeito em tudo. Quando porém vier o tempo em que o contrariarem os que deveriam andar conforme os seus desejos, então, quanta paciência e humildade ele manifestar, tanta terá e nada mais.

14 – Da pobreza de espírito
“Bem-aventurados os pobres de espírito, porque deles é o reino dos céus” (Mt 5,3). Muitos há que são zelosos na oração e no culto divino, e praticam muito a abstinência e a mortificação corporal. Mas por causa de uma única palavra que lhes pareça ferir o próprio eu ou de alguma coisa que se lhes tire, logo se mostram escandalizados e perturbados. Estes não são pobres de espírito, pois quem é deveras pobre de espírito odeia a si mesmo (cf. Lc 14,26; Jo 12,25) e ama aos que lhe batem na face (Mt 5,39).

15 – Da paz
“Bem-aventurados os pacíficos, porque eles serão chamados filhos de Deus” (Mt 5,9). São verdadeiramente pacíficos os que, no meio de tudo quanto padecem neste mundo, se conservam em paz, interior e exteriormente, por amor de Nosso Senhor Jesus Cristo.

16 – Da pureza de coração
“Bem-aventurados os puros de coração, porque eles verão a Deus” (Mt 5,8). Têm o coração puro os que, desprezando as coisas terrenas, procuram as celestiais e, de coração e espírito puros, não cessam de adorar e de ver sempre o Deus vivo e verdadeiro.

17 – Do servo de Deus humilde
“Bem-aventurado o servo” (Mt 24,46) que não se envaidece com o bem que o Senhor diz e opera por meio dele mais do que com o que o Senhor diz e opera por meio de outrem. Peca o homem que exige do seu semelhante mais do que ele mesmo daria de si ao Senhor seu Deus.

18 – Da compaixão para com o próximo
Bem-aventurado o homem que suporta o seu próximo com suas fraquezas tanto quanto quisera ser suportado por ele se estivesse na mesma situação.

19 – Entregar ao Senhor todo bem
Bem-aventurado o servo que entrega todos os seus bens ao Senhor seu Deus; porquanto, quem para si retém alguma coisa “esconde o dinheiro do seu amo” (Mt 25,18), e “o que julgava possuir ser-lhe-á tirado” (Lc 8,18).

20 – Permanecer humilde apesar dos louvores e honras
Bem-aventurado o servo que, sendo louvado e exaltado pelos homens, não se considera melhor do que quando é tido por insignificante, simplório e desprezível. Porque o homem vale o que é diante de Deus e nada mais. Ai do religioso que, enaltecido pelos outros, em sua obstinação não quer mais descer. E bem-aventurado o servo que não é por sua vontade enaltecido e que continuamente deseja ser posto debaixo dos pés dos outros.

21 – Verdadeira e falsa alegria
Bem-aventurado o religioso que não sente prazer nem alegria senão nas santas palavras e obras do Senhor e por elas conduz os homens em júbilo e alegria ao amor de Deus. E ai do religioso que se deleita com palavras ociosas e fúteis e, por esse meio, leva os homens a dar risadas.

22 – Do religioso frívolo e loquaz
Bem-aventurado o servo que não fala por interesse de recompensa nem manifesta tudo o que pensa nem é “precipitado ao falar” (Pr 29,20), mas calcula antes sabiamente o que deve dizer e responder. Ai do religioso que não conserva no fundo do ser coração (cf. Lc 2,51) os bens com que o Senhor o favorece e aos outros não os manifesta por suas obras, mas antes, na esperança de alguma recompensa, procura mostra-los aos homens por palavras. E esta será toda a sua recompensa, e os seus ouvintes colherão pouco fruto.

23 – Da reta correção
Bem-aventurado o servo que recebe as advertências, acusações e repreensões dos outros com tanta paciência como se proviessem dele mesmo. Bem-aventurado o servo que, repreendido, de boa mente se submete, com respeito obedece, humildemente reconhece sua culpa, voluntariamente oferece reparação. Bem-aventurado o servo que não procura logo escusar-se e com humildade suporta vergonha e repreensão por uma falta que não cometeu.

24 – Da verdadeira humildade
Bem-aventurado o servo que for achado tão humilde no meio de seus súditos como se estivesse no meio de seus senhores. Feliz do servo que sempre permanece firme sob a vara da correção. “Servo fiel e prudente” (Mt 24,45) é o servo que em todas as suas faltas não tarda em castigar-se, interiormente pela contrição e exteriormente pela confissão e obras de reparação.

25 – Da verdadeira caridade
Bem-aventurado o servo que ama ao seu confrade enfermo que não lhe pode ser útil, tanto como ao que tem saúde e está em condições de lhe prestar serviços. Bem-aventurado o servo que tanto ama e respeita o seu confrade quando está longe como se estivesse perto nem diz na ausência dele coisa alguma que não possa dizer na sua presença sem lhe faltar à caridade.

26 – Que os servos de Deus honrem os clérigos
Bem-aventurado o servo de Deus que põe a sua confiança nos clérigos que na verdade vivem segundo a forma da santa Igreja Romana. Mas ai daqueles que os desprezam! Pois nem que eles sejam pecadores, ninguém os deve julgar porque o Senhor mesmo reservou para si o direito de julgá-los. Porquanto na medida que excede a tudo a administração que eles exercem sobre o santíssimo corpo e sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, que eles recebem e só eles podem ministrar aos outros, em idêntica medida é maior o pecado daqueles que cometem falta contra eles do que o pecado cometido contra qualquer outro homem no mundo.

27 – Das virtudes que afugentam os vícios
Onde há caridade e sabedoria, não há medo nem ignorância.
Onde há paciência e humildade, não há ira nem perturbação.
Onde à pobreza se une a alegria, não há cobiça nem avareza.
Onde há paz e meditação, não há nervosismo nem dissipação.
Onde o temor de Deus está guardando a casa (cf. Lc 11,21), o inimigo não encontra porta para entrar.
Onde há misericórdia e prudência, não há prodigalidade nem dureza de coração.

28 – De como se deve esconder o bem para não perdê-lo
Bem-aventurado o servo que “entesoura no céu” (Mt 6,20) os bens que o Senhor lhe concede e não procura manifestá-los ao mundo na esperança de ser recompensado, pois o próprio Altíssimo manifestará as suas obras a todos quantos lhe aprouver. Bem-aventurado o servo que guarda em seu coração os segredos do Senhor.

O Cântico do Irmão Sol

Altíssimo, onipotente, bom Senhor
Teus são o louvor, a glória, a honra
E toda a bênção.
Só a ti, Altíssimo, são devidos;
E homem algum é digno
De te mencionar.
Louvado sejas, meu Senhor,
Com todas as tuas criaturas,
Especialmente o senhor irmão Sol,
Que clareia o dia
E com sua luz nos alumia.
E ele é belo e radiante
Com grande esplendos:
De ti, Altíssimo, é a imagem.
Louvado sejas, meu Senhor,
Pela irmã Lua e as Estrelas,
Que no céu formaste claras
E preciosas e belas.
Louvado sejas, meu Senhor,
Pelo irmão Vento,
Pelo ar, ou nublado
Ou sereno, e todo o tempo,
Pelo qual às tuas criaturas dás sustento.
Louvado sejas, meu Senhor,
Pela irmã Água,
Que é útil e humilde
E preciosa e casta.
Louvado sejas, meu Senhor,
Pelo irmão Fogo
Pelo qual iluminas a noite.
E ele é belo e jucundo
E vigoroso e forte.
Louvado sejas, meu Senhor,
Por nossa irmã a mãe Terra,
Que nos sustenta e governa,
E produz frutos diversos
E coloridas flores e ervas.
Louvado sejas, meu Senhor,
Pelos que perdoam por teu amor,
E suportam enfermidades e tribulações.
Bem-aventurados os que as sustentam em paz,
Que por ti, Altíssimo, serão coroados.
Louvado sejas, meu Senhor,
Por nossa irmã a Morte corporal,
Da qual homem algum pode escapar.
Ai dos que morrerem em pecado mortal!
Felizes os que ela achar
Conforme à tua santíssima vontade,
Porque a morte segunda não lhes fará mal!
Louvai e bendizei a meu Senhor,
E dai-lhe graças,
E servi-o com grande humildade.

Oração de São Francisco
Senhor, fazei-me instrumento de vossa paz.
Onde houver ódio, que eu leve o amor;
Onde houver ofensa, que eu leve o perdão;
Onde houver discórdia, que eu leve a união;
Onde houver dúvida, que eu leve a fé;
Onde houver erro, que eu leve a verdade;
Onde houver desespero, que eu leve a esperança;
Onde houver tristeza, que eu leve a alegria;
Onde houver trevas, que eu leve a luz.

Ó Mestre, Fazei que eu procure mais
Consolar, que ser consolado;
Compreender, que ser compreendido;
Amar, que ser amado.
Pois é dando que se recebe,
É perdoando que se é perdoado,
E é morrendo que se vive para a vida eterna.



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